«Alô?», atendi ao telefone que gritava pela segunda ou terceira vez, sem paciência, já de manhã. Era o mesmo número das chamadas perdidas.
«Bom dia, senhor. Aqui é da companhia telefónica. Com quem falo?», pergunta-me uma voz masculina do outro lado da linha.
«O senhor ligou, diz que é da companhia telefônica e pergunta o meu nome? Não é suposto que a companhia telefônica tenha os meus dados?», atiro-lhe revelando a impaciência espoletada pela informação de que era da companhia telefónica (ou telefônica, a depender da pronúncia do falante). Nos últimos dias, já tinha recebido alguns telefonemas da mesma empresa a “oferecer” um produto. Não entendia o motivo para insistirem com a “oferta”, quando lhe tinha declarado o meu desinteresse na aquisição do que quer que fosse. Tenho de dizer que, mesmo sem o avanço do diálogo imaginava que o contacto daquele rapaz tivesse uma razão, a mesma da rapariga e do rapaz que lhe antecederam: convencer-me a obter “um novo plano de tarifário”, sempre cheio de vantagens, por um precinho-ó.
«O senhor poderia ter registado o número em nome de outra pessoa.»
«Ah, então, o senhor sugere que eu seja um impostor? E que eu incorra no crime de identidade falsa?», estupefacto, questionei-o.
«Não, senhor, não é nada disso. Só quis dizer que…»
«Olhe, diga-me o que deseja, por favor?»
«O senhor teria interesse em adquirir um novo plano de tarifário…»
Interrompi-o:
«Então, se eu não fosse quem sou, digo, se não fosse o verdadeiro assinante desta linha telefônica, como o senhor me poderia oferecer uma mudanção de plano? Não precisaria de certificar a minha identidade? Um falsário poderia, então, efetuar alterações no meu plano e propiciar despesas financeiras para mim, sem o meu consentimento?»
«Qual o plano que o senhor assina?»
«Então, continuará a me oferecer um novo plano, mesmo sem estar seguro de que eu sou eu?»
«Senhor,» interrompeu-me ele agora, «deixe estar.»
O aparelho começou a apitar. Ninguém me ouvia do outro lado da linha.
Fiquei boquiaberto. Que impaciência, hein?! Não me deu tempo de dizer nada nem de saber o seu nome. Será que eu disse algo errado? Será que fiz algo errado? Ele desligou sem nem desejar “Boa continuação”.